Estou no meu quarto a segurar uma revista a ver a rapariga do vestido que entra, eu conheço-a. Ela olha para mim, estou em pé com a revista na mão. Ela vinha para me dizer qualquer coisa. A minha primeira reacção é vergonha depois rio-me, a situação entretêm-me. Depois, com uma pronúncia brejeira, vulgar, ordinária digo:
- “És mesmo boa pá.” Ela avança e dá-me um estalo. Eu rio-me, sorrio e digo:
-“Desculpa mas é que és memo boa.” Ela atinge-me novamente, eu avanço e á medida que me aproximo dela entalando-a entre mim e a porta ela dá-me outro estalo, e outro, e outro. Até que fica presa diante da sua única saída. Ela está num vestido de noite vermelho, elegante, comprido que deixa ver apenas o necessário para não se encarar como uma conservadora. Os braços, um ligeiríssimo decote e um corte que deixa o testemunho de breves momentos, um relance que sobe a sua perna em direcção á sua coxa, em direcção á sua intimidade. Ela olha para mim com um olhar reprovador no entanto incessante, intrigado. Eu encosto a testa á porta que nos esconde. Demonstrando a minha vulnerabilidade em oposição á minha maneira de ser que ela conhece e bem, calma e controlada. Deixo-me ficar apercebendo-me que ela está a pensar, como um pastor diante de uma equação. Ela não sabe o que fazer, o que dizer, não compreende o que pensar. As suas mãos frias que tentam acompanhar o seu sentimento deixam-se ficar descansando no meu pescoço. A minha cabeça que tinha se aproximado sem que a minha mente a tivesse controlado da sua clavícula, da sua pele entra outra vez em uníssono com um cérebro que me atraiçoara lentamente. Os meus olhos fechados abrem-se com a nitidez do meu pensar. Num movimento rápido mas não brusco estou novamente a olhar os contornos impessoais da sua expressão. Realizo que já não existe. O meu corpo que quer separa-se da minha mente que rejeita. Afasto-me dela e sem tempo para pensar uma segunda vez, considerando o ser diante de mim, digo:
-“Vai-te!” A minha própria cara a discordar com o meu cérebro, confuso e irritado.
-“Se faz favor, sai. O dia já vem longo e a noite que não se arraste.” A sua expressão é adequada mas a sua quietude não me é familiar. Num instante contraditório á lucidez que tanto me custara a alcançar aproximo-me dela, olhos nos seus olhos, passo a passo. Antes de dar o segundo passo ela vira-se e sai.
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